#36/2020 - Em tudo havia beleza, Manuel Vilas: e agora, Manuela?
Editora Alfaguara
400 páginas
Emprestado! A média anual vai bem, obrigada.
Ora bem, sabem quando saem de casa para passear e vão incomodados, porque sabem muito bem que não deviam ter saído, havia uma tarefa e não a fizeram. Mas era uma daquelas coisas que fazemos a custo, ai deixa-me lá adiar mais um bocadinho que agora não me apetece. Já estão a conseguir imaginar?
Pois bem, é assim que me tenho sentido a respeito deste livro. Já o li em agosto, ou melhor terminei a leitura em agosto, porque já andava com ele há tempo. Porquê? Porque é uma leitura penosa. Não escrevi logo sobre ele, mas sabia que teria de escrever. Não escrevi sobre ele, porque não tenho uma opinião definida.
Leio as críticas de tanta gente, talvez melhores leitores do que eu, e concordo com todas. São muito acertadas. Percebo-as, reconheço-as como legítimas, como aturadas e sábias. Mas continuo com uma ideia indefinida. Sim, o livro leva-nos numa viagem que nos alerta para a necessidade de amarmos, para a importância da memória como forma de resgatarmos o passado que não soubemos viver. Grita-nos para procurarmos a redenção da nossa efemeridade nos pequenos gestos, na procura de um encantamento que não deveríamos ter perdido ao passarmos pelos anos. O livro aponta-nos os nossos pais, força-nos a irmos à sua procura, a abraçá-los, a retê-los connosco enquanto o podemos fazer. Talvez seja nisto que reside a redenção do próprio texto, o facto de ser uma sacudidela, um balde de água de realismo para não andarmos por aí a achar que há garantias, que a felicidade, a beleza, o amor, a oportunidade estão sempre à nossa mão e que podemos escolher o tempo. Não é nada disso, a vida é acima de tudo efémera, breve, passageira, fôlego e, se sobrevivermos a quem amamos, será para nunca mais nos curarmos a dor da perda. Neste caso, Manuel Vilas ressuscita o seu pai, os seus pais, e há uma dor plangente em cada frase. É a queda, a queda reversível, papel amarrotado que nunca mais pode ser liso e incólume. A vida não nos deixa iguais, amassa-nos em dor e perda.
Este livro é isto tudo, eu sou muito pouco de relatos cor-de-rosa. Quem tem paciência para ler o que escrevo, sabe que leio livros duros, que os considero necessários, que a arte não é entertenimento, é interpelação e incómodo. No entanto, este Manuel Vilas, sendo isso tudo e talvez mais pela nota carregadíssima de sinceridade, deixou-me tão desconcertada que até hoje não tenho uma opinião definitiva sobre este livro.
Podem perguntar, então para quê ler este texto? Desculpem, é sincero. Foi o Manuel Vilas que me ensinou.