#19/2021 - O vício dos livros, Afonso Cruz: um autor viciante.
Companhia das letras
118 páginas
Maravilhoso!
Já devo ter dito/escrito várias vezes que Afonso Cruz é um dos escritores da atualidade que mais me entusiasma. É absolutamente versátil, reiventa-se em cada livro que dá a lume e é também inspirador.
O vício dos livros é composto de histórias curtas, umas de dois ou três parágrafos, outras de duas ou três páginas. Têm em comum, como o título anuncia, os livros, a leitura, a escrita, a relação extraordinária que mantemos com os livros, a forma como nos lemos neles e a forma como cada leitura é igualmente uma reescrita.
O que faz deste livro uma obra apaixonante será talvez a imensa cultura literária de Afonso Cruz, leitor compulsivo, escritor apaixonado. Para além de ficar evidente que o autor acredita nos livros e na leitura como uma forma muio específica de afirmarmos a nossa condição humana, de nos sublimarmos, de ascendermos acima da barbárie que muitas vezes nos rodeia e de que é também feita a humanidade, é clara também uma certa forma de humanismo que é muito própria deste autor. É transversal aos seus textos uma certo otimismo, uma crença na bondade humana, nos valores da tolerância, da aceitação, da gentiliza, da compaixão que muito me dizem. Pedindo desculpa pelo exagero, é como se a escrita de Afonso Cruz me desafiasse sempre a ser melhor pessoa.
Este livrinho mantém esse desígnio, cada uma das histórias é uma inspiração, mais ainda do que para lermos ou para fazermos do livro um objeto privilegiado nas nossas vidas, há em cada uma das histórias um apelo diferente. Os livros estão na base de casamentos, de amizades, de guerras, de inimizades, de acidentes. Os livros permitem adiar a morte, dão-nos a cultura necessária para distinguir o essencial do acessório, são alimento, são liberdade, permitem respirar, descansam-nos, são exigentes, não são para todos e todos são para os livros, oferecem-nos a possiblidade de sermos felizes, são testemunhos de um tempo e aviso para a navegação, fazem-nos rir e chorar, ligam o passado e o presente, permitem-nos manter o diálogo com as pessoas que amamos e que perdemos, são um perigo, imortalizam os grandes homens (já dizia Camões), descomplicam, tornam a realidade suportável, levam-nos mais longe, são vozes que nos circundam e a que devemos estar atentos.
Está tudo neste compêndio, neste tratado sobre os livros. Vão lá ler se não acreditam no que estou a dizer. É um excelente livro para livro de cabeceira, para folhearmos ao acaso e deixarmos que o oráculo destes epigramas, destes adágios fale connosco e nos ilumine por instantes. Dá-me vontade de ler mais.