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Livros para adiar o fim do mundo

Um cantinho para "falar" de livros, para trocar ideias, para descobrir o próximo livro a ler.

Um cantinho para "falar" de livros, para trocar ideias, para descobrir o próximo livro a ler.

Livros para adiar o fim do mundo

09
Nov21

#22/2021 - Ciclo Tatiana Salem Levy I

livrosparaadiarofimdomundo

Wook.pt - A chave de casa

Cotovia

126 páginas

Emprestado (a ferros, que o livro está esgotadíssimo).

A figura do círculo é geometricamente e existencialmente interessante. 

Para vos explicar esta metáfora, ou esta asserção, vou precisar de algum tempo, alguns livros, alguns posts.

Aqui há uns meses, talvez até mais do que um ano, numa daquelas publicações acerca dos melhores livros, ou da década, ou do ano, ou de sempre, ou porque sim, deparei-me com a referência a este livro e fiquei curiosa, mais a mais sendo a minha área de investigação a literatura brasileira. Pesquisei, mas não o encontrei e deixei-o esquecido, outros livros surgiram.

No início deste ano letivo, às escolas chegou a divulgação de uma iniciativa da Casa da Presidência da República, subordinada ao tema Mulheres de Coragem no Palácio de Belém. Num total de nove sessões, era possível ordená-las por ordem de preferência e inscrever duas turmas do ensino secundário. Uma dessas sessões era com Tatiana Salem Levy e aquela memória adormecida acerca de A Chave de Casa despertou e foi nessa sessão que inscrevi duas turmas do secundário. a possibilidade de participar nessa sessão levou-me a procurar outros livros da autora para conhecer o mais possível a obra e perceber a razão de ser de Tatiana Salem Levy testemunhar na qualidade de mulher de coragem.

Felizmente, a nossa escola foi selecionada. Hoje, dia 9 de novembro, pudemos então passar cerca de hora e meia a ouvir e a conhecer esta escritora.

A sessão decorreu no antigo Museu dos Coches, um espaço lindíssimo e um sítio maravilhos para ouvir uma pessoa interessante e para ouvir falar de livros e da importância da escrita e da literatura como operador catártico.

A um palanque modesto, em cima do qual estava uma cadeira e uma pequena mesa com água, chegou uma figura pequena, frágil, magra, de cabelo encaracolado. Já conhecedora dos seus livros, interroguei-me como é que desta aparência tão frágil saem palavras tão concretas, tão brutais, tão cruas, tão importantes.

A escritora parecia pouco à vontade, trazia umas páginas escritas que sustentariam o seu discurso, confirmou a sua timidez que se percebia nos gestos, na atitude corporal, nas mãos inquietas. Quando a sua voz se ouviu, senti uma espécie de magnetismo que me prendeu àquele discurso durante o tempo todo, confortavelmente instalada no conhecimento entretanto adquirido da sua escrita.

Tatiana Levy assentou o seu testemunho nas peripécias quase romanescas que fazem parte da sua biografia e da história da sua família. Há uma fusão tão completa entre a biografia da autora e as páginas dos seus livros que é quase desconcertante. Ao longo da viagem até Lisboa, fui lendo este A chave da Casa e, enquanto a ouvia, era como se ela nos estivesse a ler alguns excertos. Por outro lado, a sua coragem está presente na forma crua, concreta, específica com que ela aborda alguns temas, nomeadamente as questões ligadas a uma certa condição feminina. A autora refriu também a importância que dá à forma de dizer, de narrar, em detrimento da história propriamente dita e, para mim, a literatura é muito isso, a exploração do virtuosismo da linguagem. A coragem está também nos próprios temas da sua obra, cujas arestas nos sulcam a pele, nos deixam cicatrizes, nos incomodam, ao ponto de nos deixarem desconfortáveis.

Depois deste tempo bem passado, ganhei coragem e dirigi-me à escritora, atrevendo-me a dizer-lhe o quanto gostei dos seus livros e daquela sessão.

Amanhã, falo-vos deste livro, que li entre a viagem de ida e a viagem de volta, as últimas páginas, enquanto a noite caía, já com a lanterna do telemóvel. 

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