Às vezes também saio de casa: instantâneos da Serra da Estrela I
No passado fim de semana, também eu saí para fora cá dentro.Escolhemos um destino que conhecemos pouco, no qual nunca tínhamos estado no verão - se é que o tempo que temo tido em Portugal se pode chamar verão: a Serra da Estrela.
O plano era assentar arraias num sítio e depois, daí, partir à descoberta dos sítios todos que, depois da consulta na Internet, nos pareceu essencial conhecer. Escolhemos a Covilhã e escolhemos mal e porquê? Não por culpa da Covilhã que me pareceu uma cidade dinâmica, embelezada e muito atraente. Pareceu-nos, porque nos limitamos a ir dormir à Covilhã e tomar o pequeno-almoço, incluído na dormida. Portanto, se queres passar uns dias nos montes hermínios, vai para a Manteigas, é mais central e em princípio não tens de andar a palmilhar estradas de montanha, num breu aterrador, com medo dos abismos à tua direita, por volta da meia noite, quando regressas para dormir.
Por ser impossível resumir dois dias cheios num post sem ambições, vamos recorrer ao esquema tópicos e a vossa imaginação fará o resto.
1. Chegada à Covilhã, por volta das 23:30, telefonema para o local de dormida, cuja hora limite de check in indicava 23:00. Depois de um telefonema, o funcionário, amabilíssmo, garantiu-nos que não havia problema, tocaríamos à campainha e ele levantar-se-ia e viria abrir a porta. Mesmo com GPS, parecia impossível encontrar o local, depois de algumas voltas infrutíferas, como era, nitidamente, uma noite académica, perguntamos a um grupo de seis rapazes se nos podiam ajudar. Oh, se puderam, sacaram dos seus telemóveis, procuraram e guiaram-nos à residencial. Muito tocaditos, muito simpáticos, pelos meio ainda nos perguntaram "pagas umas jolas?" - a mim, que sou uma senhora!. Quando lhes agradeci, ainda me disseram: "Tudo bem, tamos (sic) juntos!". Há esperança para o futuro. Dormida extenuada.
2. No dia seguinte, subida à Torre, pois claro! Saída do carro, junto ao Covão do boi. Choque térmico. Com um vestido de verão, sem collants, completamente desprevenida, fui apanhada de supresa pelos gélidos 9 graus que se faziam sentir. Fogo! Corrida para o carro, que a paisagem também se aprecia muito bem de dentro dele, com o ar condicionado ligado. A subida da serra, nesta altura, com a primavera a explodir por todo o lado, as giestas a pintarem a paisagem de amarelo a perder de vista, as nuvens e o nevoeiro abaixo de nós, sentimo-nos numa "misty" paisagem. Recomendo. Depois da Torre, descida a manteigas, pelo fantástico vale glaciar. Paragem para café. Continuava frio e, de repente aborreci-me por andar de carro. Num repente, decidimos ir até Seia, porque lemos que havia um percurso pedestre fantástico, bem como duas praias fluviais a valer a pena, a de Loriga e da Lapa dos dinheiros. A vertente oeste (?) da Serra estava mergulhada num nevoeiro quase assustador, enjoei na viagem, tivemos de parar para eu vomitar. O dia estava mesmo a valer a pena! Chegamos a Seia e pareceu-me boa ideia visitar o Museu do Pão e almoçarmos, devi ser giro. Devia, devia, mas os preços pareceram-me um insulto. Sim, eu sei, este é blog de viagens brega, mas eu sou da classe média de Portugal, apesar de pagarmos impostos como se fossemos pré-ricos, a verdade é que não somos. Fugimos dali com medo de se pagar só de olhar. Fomos até ao Fim do Mundo e comemos uns chocos estufados maravilhosos, embora a decoração desencorajasse, mas a comida... quando elogiei o senhor que nos atendia, ele respondeu que as cozinheiras eram do campo e cozinhavam como sabiam... sabiam muito e sabiam bem. Só no fim, é que se descaiu a dizer que o borrego também era muito bom e que tinha uns míscaros muito saborosos... Se os chocos não fossem tão deliciosos, podia nem lhe perdoar.
3. Estava na hora de viver a tarde. Saímos de Seia em direção a Loriga, ignorando a placa que indicava Lapa dos dinheiros. A praia de Loriga fica bem à beira da estrada e é... linda, linda. Tem várias pisicinas, umas mais naturais que outras, mas de uma água transparente. À volta, socalcos e prados verdes, sem multidões. À beirinha da água, uma inglesa mudou de roupa para fato de banho e com uma coragem monárquica, enfiou-se lentamente na água, enquanto ia dizendo que era "mad", eu respondi-lhe que ela era "a brave woman". Quando a hipotermia lhe permitiu ficar submersa na água, gritou "I'm in, I'm in" . Percebi que sou uma pessoa que não sabe o que é a inveja, porque não senti nenhuma. Tenho muito medo de cair e, mais ainda, do ridículo, pelo que não arrisquei saltar sobre a água para desfrutar das mesas do parquezinho de merendas. O meu mais que tudo roubou-me o livro para me convencer. Fiquei só a olhar para as pessoas, sem ler, não me importei, gosto da contemplação. Desceu sobre mim uma paz enorme e deixei-me ficar. Depois, seguimos para a Lapa dos dinheiros.
Já é tarde, amanhã conto o resto, está bem?