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Livros para adiar o fim do mundo

Um cantinho para "falar" de livros, para trocar ideias, para descobrir o próximo livro a ler.

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Livros para adiar o fim do mundo

18
Fev20

Porquê ler Os Maias, de Eça de Queirós?

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Wook.pt - Os Maias

Em primeiro lugar, parece-me que uma boa motivação pode ser o preço. Acabei de ver na WOOK  e a versão dos Livros do Brasil, a única que aceito ler, custava menos de dez euros. Peço desculpa pela publicidade, ainda por cima não ganho nada com ela. De qualquer forma, se se pode ter um clássico por este preço a cultura acaba por nem ser elitista. Já ir à Ópera é outra história.

Ironias à parte, que este é um assunto sério, hoje deu-me para falar d'Os Maias, porque há cá em casa um estudante do ensino secundário que está a pasar pela fase de ler Eça de Queirós. A verdade é que está a correr bem e passamos a ter assunto. Ouvem-se exclamações do género "Esta Miss Sara é uma vadia";  "A Condessa é uma depravada"; "O Afonso é muito fofinho"; "A Maria Eduarda é querida para o Carlos e para Rosa". Está claro que não se tratam de recensões críticas, mas denotam interesse e uma relação com as personagens que só as grandes obras nos permitem.

Nuno Camarneiro, esse escritor que eu adoro, disse um dia que a literatura é a única forma de arte que nos permite andar com uma obra-prima debaixo do braço. E, como já disse noutras ocasiões, quando a obra é prima, ninguém lhe fica indiferente.

Sempre que me cruzo com a obra-prima de Eça de Queirós - e ele tem várias - acabo por a reler. Há passagens extraordinárias. Como nos dizia Italo Calvino, "Um clássico é um livro que nunca acabou de dizer o que tem a dizer" e essa é uma qualidade do romance de Eça. A frescura daquela sátira a Portugal teima em não empalidecer. Já reli a obra em décadas diferentes e as críticas mantêm-se atuais. Os episódios da vida romântica perpetuam-se no século XXI, daí que haja uma universalidade que faz com o livro nunca perca o vigor e o interesse. Há uns anos, recomendei o livro ao meu irmão, que nem sequer é um leitor muito assíduo, mas o fascínio que o romance exerceu sobre ele foi te tal forma que me ligava a meio da noite para comentar uma tirada, um episódio, uma ironia. Voltando a Calvino, temos nesta obra a novidade, o inesperado, o inédito que se renovam cada leitura.

Recordo só alguns momentos, episódios imortais: o arrebatamento da paixão de Pedro por Maria Monforte; as cenas da Educação de Carlos, o extraordinário Eusébiozinho, o pedante Dâmaso, a estupidez das senhores da sociedade, apesar do cuidado nas toillets, que o Eça descreve melhor que o Cláudio Ramos no programa da Cristina, a ternura do amor de Carlos e Maria Eduarda, a força de Afonso, a amizade de Carlos e Ega - quem não desejaria na vida ter uma amizade assim, o retrato desapiedado de Portugal e a escrita, Meu Deus, a escrita de Eça, ninguém como ele trabalhou as palavras deixando que elas digam de forma simplesmente perfeita tudo o que é preciso para que uma imagem fique gravada no nosso espírito.

É uma felicidade e um privilégio revisitar Os Maias. Quando lá regresso, sinto sempre que tive saudades daquele universo. Tenho dito - e acredito - que se Eça tivesse nascido Russo ou Francês a sua universalidade seria ainda maior. Nasceu português e ainda bem, que não nos sobram muitos motivos de orgulho, ou vão sobrando que, no presente, já somos um país de "conseguimentos" (Vou ali penitenciar-me por ter usado este palavrão num texto em que se fala do Santo Eça, mas decerto ele haveria de rir com a piada).

Leiam Os Maias, vai valer a pena correr o risco.

 

 

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