Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Livros para adiar o fim do mundo

Um cantinho para "falar" de livros, para trocar ideias, para descobrir o próximo livro a ler.

Um cantinho para "falar" de livros, para trocar ideias, para descobrir o próximo livro a ler.

Livros para adiar o fim do mundo

17
Mar25

#2/2025 - Eu canto e a Montanha Dança, Irene Solà

livrosparaadiarofimdomundo

Eu Canto e a Montanha Dança

192 páginas

Cavalo de Ferro

Não sei se ler é o melhor remédio, sei que é um bom remédio. Ler é tudo o que já se disse e um pouco mais que cada um de nós acrescenta. Ler, no caso deste Eu canto e a montanha dança,  é uma experiência estética que agrega beleza e poesia, como se fossem coisas diferentes. Ler é flutuar fora do tempo e do espaço e ao mesmo tempo num tempo e num espaço que é recriado pelas palavras que fluem, que preenchem a nossa perceção. Ler pode ser e é uma experiência intensamente sensorial.

Se houver alguém com paciência para ler estas palavras, não será para encontrar aqui a sinopse de um livro. Decerto procura um motivo para ler e, em particular, para ler este livro. Muito brevemente, o enquadramento da narrativa - atenção não da ação, não das palavras, porque tudo neste livro é complexo e tecido de várias camadas, daí que fuja de expressões redutoras, procuro uma forma abrangente de dizer - são os Pirinéus, eles também personagem.

O que torna este livro objeto a ser lido é, em primeira instância, a forma como memória e identidade nele se fundem: tudo é espaço de convergência - as pessoas, os animais, a natureza, as plantas, as nuvens, a chuva e o raio, os fantasmas, os seres feéricos e mágicos, míticos e imaginários. Tudo se revolve numa espiral que se refaz, não há acaso, não há exceção, não há individualidade, é uma longa e inexorável cadeia que tudo une e interliga.

Os lugares aqui descritos são aldeias recônditas, simultaneamente antiquíssimas e de hoje, nelas vivem homens e mulheres que têm o domínio dos silêncios e da distância, mais de ontem do que amanhã. Pendularmente situados entre uma espécie de panteísmo que é de inspiração antropomórfica. Essa característica contribui para a polifonia do livro, todos os seres são sujeito de narrar, todos contribuem para a composição final, todos convergem.

A composição do romance convoca e desafia o leitor, que não pode ser passivo, tem de ter atenção plena, tem de recompor, reconstruir, reestabelecer a linearidade que a narrativa fragmentou, é agente, é co-narrador.

É um romance belíssimo, no qual se cria uma atmosfera de lenda e de saga, de fantástico e de maravilhoso, de linguagem que narra poetizando o objeto contado. É mesmo muito bonito, como os olhos do corço, é arguto como as nuvens, poético como os montanheses que não escrevem as suas poesias, antes as dizem, misterioso como as mulheres de água, intencional, como as bruxas, frágil como as suas personagens, marcado pela memória como tudo e todos. Todos estes elementos ali constam, pelo meio é possível reconhecer uma história, mas esta é parte e não fim.

04
Mar25

#1/2024 - Ainda estou aqui, Marcelo Rubens Paiva: da importância da memória

livrosparaadiarofimdomundo

Ainda Estou Aqui

D. Quixote

270 páginas

Começava a falar-se com insistência sobre o sucesso do filme, realizado por Walter Salles e protagonizado por Fernanda Torres, homónimo deste livro, quando me apercebi que a fita era baseada num livro. Ora havendo um livro, diz a ciência - a partir de estudos realizados por leitores que são cinéfilos -, que o livro é quase sempre melhor que o filme. Daí que comecei pelo livro. Ao dia de hoje, já depois do Oscar para melhor filme estrangeiro, ainda não vi o filme, estará para breve, mas li, isso sim o livro. Desfaço já as dúvidas: gostei muito. Em termos de significado está ali a nível do Somos o Esquecimento que seremos. Aliás uma análise comparativa dos dois daria um estudo muito interessante. Um dia destes, curiosamente, apercebi-me que Carlos Magno, o apresentou como sugestão de leitura no momento do seu comentário semanal na CNN. E bem, e bem, a recomendação é pertinente.

Ainda estou aqui é um livro de memórias sobre a memória de Marcelo Rubens Paiva, filho de Eunice Paiva e de Rubens Paiva. Glosando várias abordagens sobre a memória, a que conservamos, a que perdemos, as que devemos preservar e resgatar, a propósito da doença da mãe, que tem Alzheimer, de cujas brumas lhe é cada vez mais difícil voltar. Com esse  mote, Marcelo Rubens Paiva vai resgatar a luta da mãe contra a ditadura e contra outras formas de opessão, assim como a história da sua família, para sempre condicionada pelos acontecimentos de 1971, em resultado dos quais o pai foi preso, durante os tempos da ditadura no Brasil, vindo a morrer na prisão, sem que a família tivesse conhecimento do seu destino, tendo de esperar longos anos até que a versão oficial fosse finalmente desmentida e que a verdade emergisse para que a família fizesse enfim o luto, para que eunice pudesse enfim ver esclarecido o seu estatuto civil.

Por um lado, temos essa imaersão nos tempos da ditadura e somos confrontados com os desmandos do autoritarismo, com a crueldade de um regime que, obviamente estava mais preocupado com a sua sobrevivência do que com a segurança dos cidadãos. Mais uma vez, a literatura recupera, expõe, resgata do esquecimento episódios que nunca deviam ser esbatidos para que não corramos o risco de ver a história repetir-se... e, no entanto, eis a história a rir-se na nossa acara, a repetir-se e a reinventar-se. É um libelo a favor da cidadania, da liberdade, da justiça e da humanidade.

Por outro lado, temos a figura de Eunice Paiva, quando casada, esposa a caber dentro de um certo modelo de mulher, mãe de cinco filhos, sem profissão. Depois da sua travessia pelo horror de se ver presa, assim como a sua filha mais velha, no mesmo dia em que o marido foi preso, vindo a morrer em resultado da tortura, Eunice empreende um longo caminho de resistência, que passa também pela sua reinvenção enquanto mulher e quanto ao seu papel na sociedade. Volta a estudar, torna-se advogada, defendo os direitos dos indígenas e procura a verdade sobre o que aconteceu a Rubens Paiva de maneira insistente e persistente até, muitos anos mais tarde, a conseguir e... uma certidão de óbito.

Eunice personifica a resistência, assertiva, digna, orgulhosa e convicta. É uma resistência sem concessões, que recusa a vitimização, cujo expoente máximo - já confundindo o livro com as muitas imagens do filme, com a fotografia que é capa do livro e cartaz do filme - é a célebre frase "Vamos sorrir. Sorriam", pronunciada por Eunice, quando a família é fotografada para uma revista, já na ausência de Rubens Paiva, recusando-se a ceder perante os desvarias de uma ordem que vinga pela força. O livro dá conta da sua coragem e dignidade públicas, em oposição ao sofrimento e às lágrimas privadas.

Vale a pena ler, porque precisamos de conhecer para avaliar, de lembrar para evitar, de nos comovermos para podermos recusar, de nos mantermos alerta. São estranhos os tempos que vivemos, talvez devamos sorrir também como forma de resistir.

Vou agora ver o filme e depois hei de escrever sobre ele.

09
Fev25

Fui ao cinema: Conclave... ensaio para um regresso

livrosparaadiarofimdomundo

Este Post é um ensio para um regresso... aqui, à escrita.

Embora tenha escrito pouco, muito pouco, as frases fervilham dentro de mim, fermentando aquilo que penso, aquilo que vejo, aquilo que vivo, aquilo que me interpela.

Tem sido um cansaço, uma drenagem de energia que me impede de concertar o que é preciso para vir aqui. 

Vim hoje. Por causa de um filme, que teve um forte impacto em mim.

Pois fui ver Conclave, protagonizado por Ralph Fiennes. Era um filme que queria ver no cinema e, depois de o ter visto lá, percebi que o filme precisa da grande tela, da imersão, da atenção plena, do som da sala de cinema, até para que os silêncios sejam mais opressivos, possam dizer tudo aquilo para que foram criados. Assim, o primeiro incentivo vai para isto: ver o filme no grande ecrã.

As primeiras cenas do filme prenderam-me logo e, penso eu, estableceram as tensões presentes no filme e as que o filme pretende explorar. Tudo começa com a morte do papa, jacente no seu leito de morte, cercado de solenidade, orações, ritualizações e a dor de quem o amava e com ele partilhava tempo e amizade. Mas mesmo um papa vê-se reduzido à humanidade, é um corpo pesado, que é preciso colocar em cima de uma maca, que é preciso empurrar por um corredor e transportar numa ambulância, que é preciso colocar num saco... o papa, desinvestido dos símbolos, é um corpo, volta a ser pó. Para mim, essa ambivalência é leitmotiv  no filme: os cardeais são, antes de tudo o mais, muito homens, muito dominados pela ambição, muito manipuladores, há muita política no meio da solenidade do conclave. Os cardeais acendem os seus cigarros, comem com gosto, alimentam discórdias e inimizades, são pequenos no meio do ambiente grandioso, profundamente ritualizado, secreto e misterioso da Cúria Romana. São homens a querer equiparar-se a deuses, ou melhor a um só deus, ou melhor ainda, ao supremo poder do papado, ainda que se lhe refiram com jugo, peso, cruz, fardo, que, na verdade, querem muito carregar.

O filme vive muito da interpretação de Ralph Fiennes, atormentado, esmagado pelo peso do papel que tem de desempenhar, é o decano e deve conduzir o conclave. E explica metade da força do filme. Ainda não vi nenhum dos outros fortes candidatos, mas já penso que Fiennes devia trazer o prémio, um prémio, qualquer que ele seja. É um grande ator. Curiosamente, vi, várias vezes o Fiennes de Grande Hotel Budapeste,  o que não tem nada de mal, antes pelo contrário, há algo de histriónico na Cúria, há algo de sarcástico e irónico no Cardeal Lawrence, que apreciei ver a espreitar de vez em quando.

O filme vive ainda da fotografia magistral, dos planos, da grandeza dos espaços do Vaticano, do ambiente claustrofóbico da Casa de Santa Marta e da Capela Sistina, dos grandes planos das maõs crispadas das persoangesn, da tensão física, do que se tenta reter e controlar, dos silêncios e da música a marcar momentos específicos, mas mais de silêncio. Tudo se conjuga para criar um ambiente denso e tenso, onde todos parecem manobrar na sombra, com um alacance inesperado, até o papa morto.

Outro momento do filme que destaco é o da homilia de abertura do conclave, tão atual, com uma mensagem na qual, parece-me, nunca é demais insistir, mais a mais nos tempos que vivemos agora. Podia ser um mantra a recitar ritualisticamente, mal não faria, a ideia de que as certezas são perigosas, isto num meio que vive dos dogmas. A dúvida como necessidade, aliás as personagens que nos são mais simpáticas são as que mais duvidam. Por fim, afinal tudo pode ser extremado, até na igreja, o discurso de ódio e de intolerância está por aí, ratificando a excitação do medo, da necessidade de voltarmos a uma espécie de pureza incial - que, na verdade, nunca existiu - para nos protegermos da ameaça do outro, do estrangeiro, do estranho.

Enfim, eu gostei muito, pareceu-me um filme poderoso, intenso, bom cinema, embora concorde com alguma críticas que têm visto o plot final como um pouco rebuscado, que será, mas o resto do filme aguenta bem esse claudicar. Ver é o melhor remédio. 

13
Out24

#44/2024 - Um dia na vida de Abed Salama, Nathan Trall - anatomia de uma tragédia em Jerusalém

livrosparaadiarofimdomundo

Um Dia na Vida de Abed Salama

Livros Zigurate

208 páginas

Este é um livro de não ficção, escrito por Nathan Trall, jornalista, analista e ensaísta norte-americano, que vive em Jerusalém, que conhece bem o conflito que envolve Israelistas e Palestinianos. O autor dirigiu durante alguns anos o Projeto Árabe-Israelita do International Cirisis Group, organização independente dedicada à prevenção de conflitos.

No contexto atual que vivemos, este livro importa, para nos ajudar a compreender aquilo que todos os dias se nos revela incompreensível. Como é que este conflito vai crescendo ano após ano, sem qualquer esperança de fim à vista. Como é possível que, após tanto desperdício de vidas, de ambos os lados, ninguém tenha a coragem de trilhar o caminho da paz e da coexistência, fazendo valer as leis internacionais, o direito, os direitos humanos?

Com essa pergunta no espírito, mergulhamos na leitura do relato, que se constrói com o entrelaçar de histórias individuais face à tragédica coletiva.O ponto de partida é um acidente que envolve um camião e um autocarro de crianças em idade pré-escolar, que iriam participar numa visita de estudo. O acidente acontece do lado palestiniano, as crianças são palestinianas, na estrada de Jaba. Uma das crianças é Milad, filho de Abed Salama. como não gosto de revelar o conteúdo do livro, fico por aqui... deixando só esta nota, efetivamente há dias na nossa vida que a mudam para sempre, que deixam cair sobre nós todo o peso do contexto em que nos movemos.

O autor, partindo do acidente, desvenda a vida de várias pessoas que, direta ou indiretamente, se relacionam com o episódio. É o motorista do autocarro, que nem queria fazer aquele trabalhao, cuja vida ficará para sempre assombrada e condicionada pelo acidente; é a médica que socorre na primeira linha as crianças, é o militar israelita que concebeu e coordenou as operações de construção dos vários muros que foram isolando israelitas e palestinianos, é o pai de Milad, Abed Salama, que, por ter integrado a Fatah, tem um cartão verde, que lhe veda a circulação no lado israelita, é a mãe que, perdendo um filho no acidente, se vê acusada e ostracizada pela família do marido, perdendo dessa forma toda a estrutura da sua vida pessoal, é um cidadão anónimo que ajuda a retirar as crianças do autocarro e que se deixa dominar pela revolta de as ver morrer sem que nenhum socorro surja, ainda que ali perto haja posto militares e de bombeiros israelitas, são os diferentes líderes palestinianos e israelittas que conseguem cooperar entre si, embora nem sempre a vida dos indefesos esteja na ordem das suas prioridades. Desta forma, este dia na vida de Abed Salama permite-nos revisitar as implicações de um conflito sem fim à vista, mas que vai pondo fim à vida de muitos inocentes, à esperança de várias gerações, roubando futuro a muitas crianças. 

À imagem das tragédias clássicas, o dia da vida de Abed Salama tem vintee quatro horas, mas nele cabem anos e anos de conflitos, guerra, morte e destruição que os habitantes daquela zona carregam consigo. Evidenciando mais o lado palestiniano, é-nos devolvido um retrato de um povo sitiado e acossado, deixando-nos para sempre a pergunta incómoda: como é que se pode viver assim, ainda que seja possível perceber que há escolas, comércio, negócios, no território da Palestina. Mas a vida está condicionada por uma série de obstáculos: físicos, judiciais, políticos, religiosos...  

Tratando-se de uma ensaio jornalístico a escrita é objetiva, o texto existe para dar conta, para mostrar, à maneira de Brecht, ao laitor cabe analisar, interpretar e, a partir da informação, tirar as suas conclusões. É um livro que nos leva a querer conhecer, perceber, dissecar como é que a História nos trouxe até aqui, porque é que todos os caminhso parecem dar em becos sem saída, daí que tenham investigado para perceber o que é a Fatah, o Hamas, o sionismo, um judeu asquenaze, a evolução da ocupação israelita, como foram e são criados os colonatos, como se organiza a vida do lado da Palestina.

Não é uma leitura para ficarmos de bem com a vida, mas é uma leitura que importa e não podemos ficar só pelo que é fácil e nos aliena, às vezes temos de tomar uma dose de realidade.

06
Out24

#42/2024 - O amante do vulcão, Susan Sontag: uma erupação lentamente efusiva

livrosparaadiarofimdomundo

O Amante do Vulcão

Quetzal

477 páginas

Tem sido isto, ler mais, muito mais do que escrever... o que vai esvaziando o sonho. Perante tanta obra prima, que lugar haverá para o que eu possa dizer?

Foi o primeiro livro que li desta autora, malhas da Hora H da Feira do Livro, em que há livros a quem damos oportunidade que, pelo preço, talvez não dêssemos. Graças aos deuses da descoberta. Se foi o primeiro... não vai ser o último, decerto.

O amante do vulcão é Sir William Hamilton, diplomata inglês em Nápoles, durante o período da ascensão de Napoleão. O período histórico é o contexto, as circunstâncias, nas quais as personagens se vão movimentar, elas sim protagonistas. O tema do livro não é a história, o tema do livros são as pessoas que viveram a história. Hamilton, para além de diplomata, é um colecionador, um vulcanólogo, vivendo sob o fascínio que o Vesúvio exerce sobre ele, na sua violência e imprevisibilidade. Aliás, o Vesúvio é leitmotiv  no livro, muitas vezes metáfora de metáforas. Apresentado assim, o livro até pode parecer maçador, mas a esta linha narrativa, dois aspetos se juntam que fazem com que, o ponto de partida, corresponda  a uma espécie de erupção.

A história de Hamilton poderia ser a de mais um diplomata, burocrata, interessado em arqueologia, como tantos outros, levando para Inglaterra inúmeros artefactos, como tantos outros, aproveitando-se ou não da ignorância dos locais. Mas este homem terá ficado para sempre ligado ao triângulo amoroso de que fez parte com a sua segunda esposa, Emma Hamilton, e Lord Nelson, o temerário herói inglês, vencedor de Trafalgar. Emma terá sido uma mulher fascinante na sua época, pela sua beleza e pelo seu talento, nomeadamente para recriar quadros vivos, representando muitas das heroínas históricas e mitológicas, musa inspiradora de muitos artistas. Por ela círam de amores William Hamiltonm, que com ela casou, depois de esta ter sido amante do sobrinho, causando grande escândalo na sociedade da época, mas também o herói inglês, Lord Nelson. 

Embora esta história, tantas vezes repetida em diferentes momentos da história: homem mais velho casa com mulher muito mais jovem, homem  mais velho é enganado pela esposa, para além do interesse despertado por se tratarem de personagens históricas, ganha contornos muito próprios por causa da voz narrativa, que não se coíbe de intervir, de comentar, de estabelecer paralelismos entre o passado e o presente, perspetivando diferentes momentos históricos.

A narrativa é a verdeira pérola deste livro, esta escrita intencional que Sontag assume de pleno direito, comentando, observando, refletindo, desvendado, levantando hipóteses, contaminando com o seu feminismo inteligente a forma como conta a história. Dessa forma, o livro vai-se renovando a si mesmo, até culminar nos últimos capítulos em que esta voz demiúrgica cede o lugar à voz e fala das suas personagens...

Talvez tenha dito demais, talvez haja aqui algum spoiler, mas não se preocupem o livro tem tanto para dar, ainda há margem para surpresas... procurem a mulher portuguesa, ela também merecedora de ser personagem de um romance; a voz de Emma, a voz de Hamilton. Esta obra já está ali num lugar especial da estante e do meu coração de livros.

18
Set24

#35/2020 - Tomás Nevinson, Javier Marías: caleidoscópio do bem e do mal.

livrosparaadiarofimdomundo

Tomás Nevinson

Alfaguara

656 páginas

Foi agosto outra vez e repeti um livro de Javier Marías, desta vez, Tomás Nevinson, que dialoga com Berta Isla, que foi o meu agosto de 2023. Desta forma, Javier Marías vai-se consolidando como escritor de culto. Só por causa das coisas, logo de seguida li Coração Tão branco, mas vamos com calma que não foi desse que vim aqui falar.

Comecemos pela minha introdução à obra de Marías. O primeiro livro dele que me veio parar às mãos foi Enamoramentos, que me enfadou, de maneiras que não terminei a leitura. Senti uma espécie de Marías exclusão, pois era um escritor que via sempre muito bem cotado e a mim nada... Depois li Berta Isla e fiquei cheia de vontade de ler Tomás Nevinson,  e agora eis-me aqui rendida a este escritor: complexo, intrigante, profundo, inquiridor.

Tomás Nevinson é o marido de Berta Isla, que entra para os serviços secretos britânicos por circunstâncias estranhas. Dada a sua profissão, ele é e não é, está e não está, existe e não existe, faz e não faz, como tão bem o define o seu chefe Bertram Truppa. Em Berta Isla, Tomás é quase personagem secundária, como se o escritor mimetizasse no romance o secretismo da sua profissão. O leitor sabe o que Tomás faz, mas isso é traçado a pinceladas vastas e genéricas, nunca uma missão sua é devassada, só a sua intermitência na vida de Berta. O que é trazido à luz é o impacto dessa intermitência na vida de Berta, essa descontinuidade que a desagrega e a vai indefinindo na sua condição de mulher de Tomás.

Neste volume, Tomás é o protagonista, é Berta que é deixada na sombra. Regressado à ação, mais uma vez devido a Bertram Truppa, Tomás aceita uma missão, que lhe devolve algum sentido à existência. No entanto, o início do livro é decisivo para a tese que se vem a enunciar: havendo a possibilidade de se ter assassinado Hitler e, dessa forma, impedindo todo o mal que conhecemos, esse ato é legítimo ou ilegítmo, ou como conclui uma das personagens, estando o nosso destino traçado há alguma forma de lhe escaparmos? Esta questão, podemos decidir quem vive e quem morre e em nome de que valores, estrutura toda a narrativa. Tomás terá de decidir para levar a bom porto essa missão, ter esse poder enorme, legitimado até, sobre se uma mulher pode viver ou se deve morrer. 

Para além desta equação que estrutura a história, a qualidade do livro está definitivamente na escrita. Marías é um escritor-leitor, percebemos que muita da sua cultura e erudição são matérias primas que cimentam a escrita. Todo o livro é diálogo, exegese, questionamento sobre a ambiguidade em que nos movemos, quem está do lado do bem e do lado do mal, quem tem legitimidade e quem não a tem, sendo os serviços secretos, ao serviço de quem efetivamente estão, e se em lugar de serviços secretos a bem de todos, forem, antes, interesses secretos, a bem de gente obscura? Essa nota de ambiguidade mantém-se em múltiplos aspetos do livro, até na cidade do Noroeste de Espanha, recôndita, provinciana, para a qual Nevinson se muda, e que nos interrogamos continuamente acerca da sua localização, será Ourense, será Lugo, será outra qualquer, ou um pouco de todas elas. 

Enfim, será difícil despertar o interesse para a leitura, quando se escrevem textos longos, de maneiras que me fico por aqui, talvez incompleta, talvez ambígua, mas rendida a Javier Marías, que se vai agigantando nos meus gostos de leitura. Vale a pena ler.

 

04
Jul24

#11/2024 - Apneia, Tânia Ganho:

livrosparaadiarofimdomundo

Apneia

Casa das Letras

690 páginas

Às vezes, apetece-nos mergulhar num livro de cabeça, abandonarmo-nos a ele e deixar que essa leitura nos absorva, enquanto durar. Foi nesse estado de espírito que peguei neste livro. Recomendadíssimo por uma amiga, que partilha comigo muitas leituras e um gosto muito semelhante, sabia, à partida, que não me iria desiludir. O livro é extenso e prometia boas horas de leitura. Hoje, à distância de uma semana, penso nessa amiga, a entrar no gabinete e a dizer-me "tens de ler este livro." Ela sabia o que estava a dizer.

Não resistindo a um trocadilho fácil, diria que lemos este livro em apneia, tal a intensidade das suas páginas. É quase uma armadilha, o leitor chega ali, desprevenido, lê dois ou três capítulos (os capítulos são curtos) e é, literalmente, fisgado e arrastado para a narrativa. 

O livro conta a história de Adriana que abandona o marido Alessandro, levando consigo o filho de cinco anos e é partir dessa decisão que a narrativa ganha fôlego. Em minha opinião, todo o livro evidencia uma enorme inteligência na sua composição, a estrutura mimetiza a mensagem. As primeiras páginas são ainda evasivas, incertas, ainda não conhecemos Adriana, aquele casamento parece ter alguns porblemas, alguma instabilidade, mas pouco percetível, porque a verdade é que os danos são subtilmente inflingidos, de maneira insidiosa, minando a integridade psicológica de Adriana. É ao longo da leitura que nos é revelado o alcance do mal. Alessandro é metódicamente cruel, meticuloso no mal que exerce e Adriana é remetida à metáfora da rã mergulhada na água que vai aquecendo até a aniquilar, porque a habituação a impede de reagir aos sinais de alarme. É este o tipo de violência de que Adriana é objeto. Outro aspeto a sublinhar é, pegando num conceito da teoria literária, o facto de Adriana ser verdadeiramente uma personagem modelada, que se transforma e se transfigura num processo que começa no instante em que abandona o seu casamento. Há uma trajetória demorada que leva a personagem de uma espécie de passividade e apatia à mulher que bate o pé, diz não, enfrenta e confronta, recorre a todos os meios para se salvar a si e ao filho do polvo maldoso que são as ações despudoradas do seu agressor, porque, sem levantar um dedo, o marido é um predador, um manipulador, uma aranha que tece a teia onde os incautos se deixam enredar. O ritmo da narrativa é, por isso, muito mais rápido no final do livro, precipitando os acontecimentos. A construção das três personagens, pai, mãe e filho, é uma das chaves da qualidade deste livro, são todos inesquecíveis. O embate de Adriana com uma justiça lenta, enviesada por narrativas contraditórias, quase preguiçosa, negligente ou excessivamente cautelosa, revela uma dimensão escondida de todas as questões ligadas à violência doméstica e às situações de todo e qualquer abuso, terreno minado onde ninguém parece querer aventurar-se, arriscar, procurar a verdade. A extensão do livro espelha estes meandros de lentos avanços e demasiados recusos, de profunda impotência, solidão e revolta das vítimas, condenadas inexoravalmente à dúvida, à descrença, a rótulos que comprometem a fiabilidade das suas narrativas. É kafkiano! Adriana e o filho são fustigados por uma inércia que parece favorecer sempre o agressor. 

Dizia a minha amiga: "É um livro que nos persegue", eu digo que nos assombra, mas criamos uma tal empatia com Adriana e o filho, prendemos a respiração juntamente com eles e corremos pelas páginas na esperança de que ambos encontrem uma saída da teia malevolamente tecida à volta deles, ansiando para que se libertem, venham ao de cima, inspirem finalmente o ar de que precisam e consigam, enfim, deixar de viver em apneia.

Que leitura!  que difícil que é fazer-lhe justiça. 

Não deixem escapar este livro, é poderoso, impregna-se em nós e obceca-nos. Adoro este efeito de um livro em mim. Que experiência de leitura.

11
Mai24

#10/2024 - Hotel Savoy, Joseph Roth: da metáfora

livrosparaadiarofimdomundo

Hotel Savoy

D. Quixote,

154 páginas

Joseph Roth é um dos meus autores preferidos. Há qualquer coisa na sua escrita que me prende, não sei se umas certas notas de nostalgia, não sei se a elegância da escrita, não sei..., mas gosto sempre dos seus livros.

Este Hotel Savoy, parafraseando uma das frases do próprio livro, parece-me o mais russo dos seus romances, quase próximo de Dostoievski. Há, quanto a mim, uma tensão social latente, emergente, entre os habitantes da cidade onde se situa o Hotel, entre os hóspedes do Hotel, entre os hóspedes e os funcionários do hotel. Tudo é tensão neste livro.

Gabriel Dan é judeu, foi prisioneiro de guerra, durante três anos, num campo na Sibéria, regressa a casa, passando por uma espécie de peregrinação desde o campo de prisioneiros, desempenhando várias funções subalternas e assalariadas até ali chegar: a uma cidade que fica às portas da Europa, ao hotel mais europeu daquela cidade oriental. Ser o Hotel mais europeu significava que tinha um porteiro fardado, criadas de toucas brancas, casas de banho inglesas, elevadores, lâmpadas elétricas... enfim, pequenos luxos conotados com a Europa.

Não consigo deixar de ver aquele hotel, onde o protagonista, apesar de pobre e desenraizado, pode hospedar-se, embora num dos quartos mais baratos, como uma metáfora da Europa, tanto do período após a Primeira Guerra Mundial, como da de hoje, aquelas em que vivemos: igualmente ameaçada pela guerra, igualmente percorrida por hordas de pessoas em busca de  um lugar de ser com dignidade. Esta hipótese de leitura sustenta-se em algumas passagens da obra, que são quase fragrantes, denúncias de um quadro de pobreza, abandono, assimetrias sociais e ecnómicas, que volvido um século, persistem na Europa e continuam a separar as pessoas em função do que possuem. No Hotel Savoy, as pessoas importantes, ricas e poderosas estão hospedadas nos andares inferiores, nos quais os quartos são arejados, amplos e limpos por criadas de touca branca, porque neles há uma maior preocupação com a limpeza. Quanto mais se sobe nos andares, maior é a pobreza, quando não a indigência dos hóspedes, doentes, dependentes de usurários que deles se aproveitam, subalimentados, vendo-se obrigados a entregarem-se a papéis degradantes para poderem subsistir. 

Diz-nos o narrador que, em todas as cidades do mundo, há sempre hotéis Savoy, onde uns vivem e outros morrem... 

Os excluídos, por tudo isto, encontram-se sempre em trânsito, ambicionando um outro lugar, acreditando que, algures, haverá uma cidade, sempre a próxima cidade, um outro país - linha do horizonte que nunca se alcança - onde finalmente poderão ser felizes e escapar à sua condição: Viena, Paris, a América.

É impossível não estabelecer o paralelismo com a atualidade, com a Europa de hoje, a cuja porta tantos tentam uma vida melhor.

Repito, gosto de livros que me interpelam, que me deixam cicatrizes, que me levam a olhar para o outro com as lentes da empatia e da tolerância, daí que goste deste livro, ainda que ele me tenha deixado um pouco desconcertada.

Recomendo para ler e, em especial, para reler, porque nem todas as implicações são óbvias na primeria leitura.

 

 

25
Fev24

Às vezes também vou ao cinema: A Zona de Interesse

livrosparaadiarofimdomundo

 

Em minha opinião, estamos a ter uma excelente época de cinema. Efetivamente, tenho visto filmes de excelência, nomeadamente o extraordinário Os Excluídos, mas não é sobre esse que venho escrever hoje.

Um dos filmes pelos quais tinha mais curiosidade era precisamente A Zona de Interesse, adaptação do romance homónimo de Martin Amis, e essa atração vinha precisamente da fotografia, a partir dos curtos trailers que iam surgindo nas redes sociais. Assim, pus-me a caminho e lá fui ver o filme e em boa hora o fiz, já que, para mim, foi uma experiência marcante, muito marcante.

O filme acompanha a vida familiar de Rudolph Hoss e da sua esposa Hedwig, assim como dos filhos, cinco, entre rapazes e raparigas, numa casa onde impera a ordem, a harmonia, a arrumação e um bem-estar por demais óbvio. A residência da família está circundada por um jardim muito bem cuidado, com imensa variedade de flores, recantos idílicos, de um bom gosto extremo, equilibrado, com piscina, relva de um verde luxuriante. A vida familiar decorre numa tranquilidade que deve ser o sonho de qualquer um: marido e esposa respeitam-se, não há discussões, as crianças são obedientes, frequentam a escola, as serviçais da casa mantêm tudo em ordem. Em tudo aquela família e aquele espaço são perfeitos.

Acontece que Rudolph Hoss é o comandante que gere o campo de extermínio de Auschwitz, acontece que a casa de família vive paredes meias com os muros do campo, aliás, o dedicado comandante sai todos os dias de manhã para o seu emprego, bastando-lhe atravessar uma pequena cancela antes de penetrar no campo. Acontece que os muros que circundam o jardim são os muros do campo, ainda não totalmente cobertos pelas plantas e arbustos cultivados por Hedwig, a fim de ocultar a falta de beleza dos mesmos. Acontece ainda que o quotidiano da família é pontuado pelos ruídos que chegam do campo, tiros, vozes, ordens gritadas, comboios que chegam e que partem.

O filme é avassalador, é esmagador. Não há uma única imagem sobre as atrocidades e o horror de Auschwitz, mas esse horror é omnipresente, ainda que conscientemente ignorado por todos os elementos da família. Mas o horror maior é mesmo a banalidade do mal, tal como definido por Hanna Arendt, a indiferença total, o cinismo das palavras, o oportunismo com que os nazis (con)viveram com o sofrimento de milhares de pessoas, focados nos seus interesses. Hoss não é mais do que um funcionário que se preocupa com as suas metas e objetivos, em progredir na carreira, naquela carreira, preocupado em resolver os desafios que novas "encomendas" lhe trazem, como outro qualquer diretor de empresa. Hoss é muito competente no que faz, é uma referência, e o filme revela-nos o quanto, já no seu final, sempre dessa forma, quase como o teatro de Brecht, apenas nos mostra, o resto é connosco. Aqui e ali, se estivermos muito atentos, vamos percebendo, vamos lendo os sinais da distopia, mas são subtilezas apenas.

Em termos cinematográficos, do pouco que entendo, a fotografia, a banda sonora, os planos de filmagem, o desempenho dos atores, conjugam-se no mesmo objetivo, é como se o realizador mostrasse pelas suas personagens a mesma indiferença que perpassa por todas as cenas, com pouquíssimos, grandes planos, que, às tantas, quase nos fazem falta, queremos disitnguir os rostos, queremos contemplá-los para, nessa proximidade, os podermos odiar, mas tal não é possível. Tudo isso contribui para a forte impressão que o filme causa, em especial, como se mantivesse o espectador também à distância. 

É um filme para se ver no grande ecrã, na sala escura, a sós com as cenas. É, dentre os muitos bons filmes que vi este ano, o melhor de todos eles. Para mim, leiga nestas coisas, uma verdadeira obra-prima e tão forte, que me custou a levantar da cadeira quando terminou. Ficou-me esta reflexão, nestes tempos pouco encorajadores, a arte vai-se revelando uma forma de intervenção, de despertar para a proximidade do mal, para a emergência da empatia, e isso é uma coisa boa.

Vale a pena ver.

Fica a vontade de ler também o livro.

13
Fev24

#13/2024 - pequenas coisas como estas, Claire Keegan: manifesto contra a indiferença

livrosparaadiarofimdomundo

Pequenas Coisas como Estas

Relógio d'Água

81 páginas

Apetece-me só deixar a imagem da capa, a indicação das páginas, que não desencorajam ninguém, e dizer para se aventurarem na leitura deste pequeno/enorme livro, para se verem surpreendidos como eu.

Mas a verdade é que não consigo ficar calada, tenho sempre que dizer alguma coisa: por exemplo, leiam este livro, mesmo que seja o único que vão ler na vida. Vale cada palavra, cada linha, cada pequeno capítulo.

A história apresenta-nos (como ponta do iceberg) o dia a dia de Bill Furlong, comerciante de carvão, assoberbado com trabalho nos dias que antecedem o Natal, agudizados pelo clima frio da Irlanda. Bill é pai de família, tem cinco filhas e vive para as educar e para lhes garantir um futuro mais ou menos tranquilo numa Irlanda sempre marcada pelo estigma da pobreza. Nesses dias, Bill dá por si a questionar a sua vida, a ansiar por qualquer coisa imprecisa, a recordar a sua infância, a forma como a mãe teve a sorte de se ver protegida pela patroa, quando se soube grávida em solteira. A Bill nada faltou, apenas um puzzle que ele tinha desejado num dos Natais da infância. Como muitas outras crianças nessa época, fruto de circunstâncias idênticas, Bill nunca conheceu o pai. Este dado da biografia de Bill é fundamental para perceber a mensagem da história.

Sobranceiro à vila, situa-se o convento, paredes meias com o colégio onde estudam as filhas de Bill, igualmente administrado pelas freiras. Bill é o fornecedor de carvão do convento.

Mais não digo, porque não posso, nem quero, estragar-vos o prazer da leitura e de estabelecerem os nexos da história. O que é verdadeiramente impressionante neste livro é a forma como a autora sem falar da atrocidade de que se propõe tratar, consegue, com breves pinceladas, dar-nos conta da desumanidade, da hipocrisia, da crueldade, da indiferença que entornam o assunto que está ali a ser tratado. O que é aqui equacionado é como é possível, paredes meias com o horror, permanecer indiferente, fazer-se de conta que não se sabe, ceder à imposição do silêncio, enquanto seguimos a nossa vida tranquilamente, sem levantarmos ondas. Não há nesta observação o mínimo juízo de valor. É mais uma interrogação, é mais o desejo de não nos vermos assim testados e interpelados. É esse o motivo do livro.

Por outro lado, cada página traz-nos a imagem da irlanda, dos seus hábitos e tradições. É como se fôssemos transportados até lá, sorvessemos o mesmo chá a propósito de tudo e de nada, entre outros apontamentos. É, por fim, a clareza da linguagem, sem equívocos, sem hermetismos, na sua desconcertante simplicidade, de quem se limita a mostar, a apontar, deixando-nos a responsabilidade de trilharmos o caminho.

Deixo como última recomendação, a mais importante de todas, a leitura da nota final e garantir-vos que não há arrependimento possível por virmos a este livro, mais um que me inspirou a vontade de ser melhor do que aquilo que sou, que me desafiou a superar-me, a centrar-me na bondade, na coragem, na indignação.

Leiam, vão ver que vale a pena.

 

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2025
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2024
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2023
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2022
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2021
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2020
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2019
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2018
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2017
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2016
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2015
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2014
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
Em destaque no SAPO Blogs
pub